I- Autor:
Fernando Antônio Nogueira de Seabra Pessoa nasceu e morreu em Lisboa [1888-1935]. Aos cinco anos, ficou órfão de pai. Sua mãe casa-se, dois anos depois, com um militar que, nomeado cônsul na África do Sul, leva para lá a família. Fernando permanece lá por dez anos, durante os quais cursa o primário e o secundário, em contato íntimo com ao língua e cultura britânicas. Volta a Lisboa em 1905 e matricula-se no Curso superior de Letras, mas não o conclui. Na década de 1910, colabora em algumas revistas, como A Águia, por exemplo, e entra em contato com as vanguardas europeias. Em 1914, publica poemas na revista A Renascença e cria os seus famosos heterônimos, cujos principais são: Alberto Caeiro, Ricardo Reis, Álvaro de Campos. No ano seguinte, ajuda a fundar a revista Orpheu, marco inicial do Modernismo português.
II- Odes de Ricardo Reis
Ricardo Reis, um dos heterônimos de Fernando Pessoa, nasceu em 1887, no Porto [um ano, portanto, mais velho que Fernando Pessoa], é médico e cultor dos clássicos gregos e latinos. Seu paganismo deriva, pois, da lição dos escritores antigos, mas também revela a influência de Alberto Caeiro, no amor pela vida rústica, no apego à Natureza. Sua poesia, no entanto, distancia-se enormemente da de Caeiro por ser hiperculta, neoclássica.
linguagem densa - sintaxe latinizante
gosto pelo vocabulário raro
temas [lugares-comuns clássicos]: a brevidade da vida, a necessidade de gozar o presente
odes à maneira antiga, com estrofes que alternam versos longos e breves, de métrica perfeita e sem rima
Os traços biográficos explicam perfeitamente as inquietações que marcam a poesia de Ricardo Reis, resultando num poeta de inspiração neoclássica, horaciano na constante preocupação de "gozar o momento" [o que nos remete ao carpe diem horaciano do século XVIII], já que a vida se resume a esses breves momentos:
"Mas tal como é, gozemos o momento
Solenes na alegria levemente
E aguardando a morte
Como quem a conhece."
ou ainda:
Buscando o mínimo de dor ou gozo
Bebendo a goles os instantes frescos,
Translúcidos como água
Em taças detalhadas,
Da vida pálida levando apenas
As rosas breves, os sorrisos vagos,
E as rápidas carícias
Dos instantes volúveis.
Fragmento poético com linguagem simples:
Ao longe os montes têm neve ao sol.
Mas é suave já o frio calmo
Que alisa e agudece
Os dardos do sol alto.
Hoje, Neera, não nos escondamos.
Nada nos falta, porque nada somos.
Não esperamos nada
E temos frio ao sol.
Mas tal como é, gozemos o momento,
Solenes na alegria levemente,
e aguardando a morte
como quem a conhece.
As alusões mitológicas e sintaxe latinizada, aparecem neste outro poema da brevidade da vida:
As rosas amo dos jardins de Adônis,
Essas volucres amo, Lídia, rosas,
Que em o dia em que nascem,
Em esse dia morrem.
A luz para elas é eterna, porque
Nascem nascido já o sol, e acabam
Antes que Apolo deixe
O seu curso visível.
Assim façamos nossa vida um dia,
Inscientes, Lídia, voluntariamente
Que há noite antes e após
O que pouco duramos.