Pesquisa de José Marins
No Brasil, o haikai começou a ser difundido na primeira e na segunda décadas do século XX, a partir da imigração japonesa e de Afrânio Peixoto. No Paraná, segundo MARINS (2004), no ensaio ‘Helena Kolody, pioneira do haicai’, (2004), os primeiros intercâmbios aparecem no final da década de 30, através do contato entre Fanny Luíza Dupré e Helena Kolody (1912-2004), por meio de correspondências, indicações de leitura e até de uma possível visita de Fanny à Helena, conforme o registro de Dupré no haikai de Pétalas ao Vento, na página 89 (MARINS, 2004):
Pinheirais augustos.
Curitiba. Paraná...
Vestidos de verde.
Há ainda, na página 45, um haikai dedicado à Helena (MARINS, 2004):
Vastos pinheirais!
É clara noite de lua...
Mais abaixo, o mar!
Dupré, que era ligada ao seleto grupo dos iniciadores de haikai no Brasil, especialmente a Jorge Fonseca Júnior, também era amiga e orientadora de Helena e, por estes vínculos, transmitiu informações e esclarecimentos à amiga paranaense sobre o poema japonês. Não demorou muito para que Helena Kolody começasse a compor seus próprios haikais.
Com o lançamento de seu primeiro livro Paisagem Interior, em 1941, contendo três haikais, Helena passa a ser a pioneira do haikai no Paraná, assim como a primeira mulher a publicar haikais em livro no Brasil, fato que só acontecerá à Fanny em 1949.
Em 1945, Helena Kolody publica seu segundo livro, Música Submersa (MARINS, 2004). Entre os poemas, encontra-se o famoso haikai Pereira em flor (KAMITA, 2000):
De grinalda branca,
toda vestida de luar,
a pereira sonha .
Durante muito tempo, a relação entre Helena e o haikai ficou um pouco distante. Estreitou-se novamente quando conheceu Paulo Leminski (1944-1989), em meados da década de 60, como vizinhos do Edifício São Bernardo. O poeta curitibano elogiou os seus haikais e isso trouxe a ela um novo ânimo: “Só voltei ao haikai quando o Paulo Leminski descobriu-me como a primeira pessoa a fazer haikai no Paraná” (MARINS, 2004).
A partir de então, ambos vão trocar informações sobre o haikai. Leminski vai mais longe ainda, chegando até a aprender japonês para mergulhar no espírito da língua e na cultura oriental. Da troca de elogios entre eles, Helena diz que Leminski é “o verdadeiro haicaísta”, “seus haikais foram tão autênticos”, e Paulo retribui, “Padroeira da poesia”, “Santa Helena Kolody”. A respeito de livro Sempre Palavra, Leminski disse, “inclui uns quarenta pequenos poemas. Mas tem luz bastante para iluminar esta cidade por todo um ano”, “Nossa padroeira é a poeta mais moderna de Curitiba” e “Tem certas manhãs azuis em Curitiba, mas tão azuis, tão azuis, que eu tenho certeza: Helena Kolody acordou cedo e olha por todos nós” (MARINS, 2004). É deste livro o haikai Gestação (MARINS, 2004):
Do longo sono secreto
na entranha escura da terra,
o carbono acorda diamante.
Helena se tornou um mito, dentre antologias, trilogias, poesias completas e escolhidas, tem mais de vinte livros publicados. Sua obra foi objeto de estudo em várias teses de mestrado. Recebeu da Comunidade Nipo-Brasileira de Curitiba a Outorga de nome haicaísta Reika. Foi homenageada pela Feira do Poeta de Curitiba e recebeu o título de Cidadã Honorária de Curitiba e de Doutora Honoris Causa, pela Universidade Federal do Paraná. Tornou-se patronesse das cadeiras do Centro Paranaense Feminino de Cultura e foi eleita para a Academia Paranaense de Letras. Entre tantas outras homenagens, participou de um filme dirigido pelo cineasta Sylvio Back, A Babel de luz, em homenagem aos 80 anos da poetiza, que ganhou o prêmio de melhor curta e melhor montagem no 25º. Festival de Brasília do Cinema Brasileiro (MARINS, 2004).
Conforme a pesquisa ainda inédita “A História do Haicai no Paraná”, realizada por José Marins (MARINS, 2007), existem, no Paraná, mais de cento e quarenta autores de haikais e cinco tendências ou vertentes. Para ele, é difícil aceitar algumas produções como poemas do tipo haikai, pois acha que há um grande equívoco sobre o conceito de haikai para alguns autores. Nem todo terceto é um haikai. Alguns escritores escrevem apenas tercetos que denominam de haikai, permanecendo o equívoco literário.
Como já vimos no item 2.1 O QUE É O HAIKAI, há várias características para que um terceto se torne um haikai, o que chamamos neste trabalho de haikai clássico no Brasil. Por causa da conversão cultural, da interpretação e da tradução, o haiku perde um pouco de suas propriedades, mas a sua essência é mantida no haikai, e como já dissemos, a língua portuguesa foi contemplada graças a Goga.
As vertentes constatadas por MARINS (2007) são as seguintes:
Japonesa
Ocorre dentro da colônia nipônica, onde a produção do haikai é feita em língua japonesa. Seus principais representantes são os seguidores de Nenpuko Sato, principalmente no norte do Paraná.
Kolodyana
As características desta vertente consagrada por Helena Kolody são:
- Usam títulos;
- Às vezes usam rimas;
- Às vezes usam a métrica;
- Personificam os seres da natureza;
- Muitos de seus haikais são em uma frase só (em uma parte);
- Usam uma linguagem muito poética.
Os poetas que se destacam são Helena Kolody, Delores Pires, Diva Ferreira Gomes e João Manuel Simões.
Guilhermina
- Usam rimas no primeiro verso com o terceiro e no segundo verso, rimam a segunda sílaba com a sétima;
- Usam títulos.
Duas poetizas se destacam nessa linha: Leonilda Hilgenberg Justus e Shirley Queiroz.
Haikai livre
- Não usam a métrica;
- Às vezes usam a rima;
- Quase não usam o kigo;
- Usam a ironia e o senso de humor;
- Deve haver o haimi (o sabor, cheiro, toque ou imagem de um haikai);
- Deve haver o ponto e contraponto, o permanente e o provisório unidos no mesmo poema.
Dessa vertente, os nomes principais são: Paulo Leminski, Alice Ruiz, Domingos Pelegrini, José Marins e Eduardo Hoffman.
Haikai clássico
Nessa forma, os poetas que mais se destacam são: Delores Pires, José Marins, Sérgio Francisco Pichorim e Neide Rocha Portugal.
Referências
MARINS, José. Haicai. Palestra na Biblioteca Pública do Paraná. Curitiba, 2004. (Documento em anexo).
MARINS, José. Entrevista eletrônica concedida a Alvaro Mariel Posselt. Curitiba, 29 abr. 2007.
MARINS, José. A História do Haicai no Paraná. Palestra no Centro de Letras do Paraná, Curitiba, maio, 2007.
Caqui - Revista Brasileira de Haicai. Artigo de José Marins sobre Helena Kolody, pioneira do haicai, de 17/12/04. São Paulo, 2004. Disponível em http://kakinet.com/caqui/kolody.php. Acesso em 07 mar. 2007.
KAMITA, Rosana Cássia. Jornal de Poesia. Artigo de Rosana Cássia Kamita, Analisando o haicai Pereira em Flor de Helena Kolody. Disponível em http://secrel.com.br/jpoesia/rkamita.html#haicai. Acesso em 07 mar. 2007.
Obs: Este texto foi extraído do TCC “O HAIKAI EM SALA DE AULA”, de Alvaro Mariel Posselt, Universidade Tuiuti do Paraná. Curitiba, junho de 2007.