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Revolução Francesa de 1789, A

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A Crise do Regime Absolutista

Na primeira metade do século XVIII, a França conheceu um período de desenvolvimento econômico. A agricultura e a produção manufatureira aumentaram significativamente. Surgiram as primeiras indústrias de ferro e de carvão. O comércio internacional quadruplicou o seu volume. A burguesia cresceu e diversificou suas atividades e seus lucros, mas permaneceu às margens das decisões políticas do Estado absolutista, dominado pela aristocracia (alto clero e alta nobreza).

A expansão econômica foi acompanhada da alta dos preços, afetando principalmente a nobreza, que vivia de rendimentos fixos, e a população rural. Para se defender, a aristocracia aumentou o nível de exploração sobre os camponeses, criando novos tributos e obrigações e passou a ocupar todos os cargos e postos administrativos do Estado, da Igreja e do Exército, impedindo a ascensão social e política até mesmo da alta burguesia financeira.

Em consequência da reação aristocrática, cresceram as críticas aos fundamentos do Antigo Regime, levando a burguesia a aderir às ideias de filósofos iluministas como Montesquieu, Diderot e Rousseau que defendiam a igualdade de todos perante a lei, a tolerância religiosa e a livre expressão do pensamento. Contra a sociedade de ordens e de privilégios do Antigo Regime, os iluministas sugeriam um governo (monarquia ou república) constitucional e parlamentar.

Os economistas, como François Quesnay e Adam Smith, propunham o fim do Mercantilismo e a adoção de uma política econômica liberal, sem a intervenção do Estado na produção e na circulação das mercadorias. Influenciada pelo Iluminismo, a burguesia reclamava igualdade jurídica com a aristocracia e liberdade individual de empreendimento e de lucro.

Em 1756, no reinado de Luís XV (1715/1774), a França enfrentou, uma guerra desastrosa contra a Inglaterra - a Guerra dos Sete Anos (1756/1763) - iniciada na América, entre colonos franceses e ingleses, Derrotada, a França perdeu suas colônias americanas (o Canadá, a região do Rio Mississipi, a Luisiana, algumas ilhas das Antilhas), prejudicando a burguesia mercantil e enfraquecendo o Tesouro Real.

A insatisfação da burguesia aumentou porque, mesmo sendo numero sa, instruída e abastada, achava-se impossibilitada de conseguir ascensão social e participação política, devido à reação aristocrática. O historiador M. Florenzano assim descreve o que se passava: "De 1714 a 1789, todos os ministros, à exceção de três, foram aristocratas; os plebeus foram excluídos dos Parlamentos e das Intendências reais; na Igreja, todos os bispos e arcebispos eram nobres, assim como os diretores de conventos, abadias, etc; no Exército, desde 176O, os oficiais não mais podiam ser plebeus".(FLORENZANO, Modesto. As revoluções burguesas. São Paulo, Brasiliense, 1988, p. 23.).

Ao subir ao trono em 1774, Luís XVI encontrou o Tesouro Real arruinado, o comércio colonial enfraquecido e grande descontentamento entre a burguesia, os "sans-culottes" (1) e os camponeses. Através de seu ministro Turgot, propôs mudanças no sentido de reduzir os gastos da 11 corte, libertar o comércio de taxas e de aduanas internas cobradas pelo Estado e por particulares, aumentar os impostos sobre a terra incluindo a aristocracia e aliviar a carga fiscal dos camponeses.

As tentativas de reforma fracassaram porque iam contra os interesses do alto clero e da nobreza e Turgot foi demitido. Ficou claro que, enquanto a aristocracia mantivesse seus poderes através dos Parlamentos do reino e dos cargos administrativos, nenhuma decisão que contrariasse seus interesses poderia ser tomada.

A situação do Tesouro Real agravou-se após 1778, ano em que a França entrou na guerra de independência norte-americana fornecendo aos colonos substanciais ajuda em navios, armas, munições e soldados. Os sucessivos ministros nomeados por Luis XVI (Necker, Calonne e Brienne) nada conseguiram fazer para solucionar os problemas financeiros do país.

Em março de 1788, as despesas do Estado francês com a Corte, a administração, a justiça, o exército e a diplomacia estavam calculadas em 629 milhões de libras, enquanto que as receitas eram de 5O3 milhões, configurando um déficit de 126 milhões, ou seja, 2O% do orçamento. Em setembro, fracassou a tentativa do ministro Brienne em fazer uma reforma fiscal com a colaboração da monarquia. Em consequência o governo' entrou numa crise sem precedentes, envolvendo o rei, a nobreza, a burguesia e as classes populares.

Da Assembleia dos Estados Gerais à Assembleia Nacional Constituinte

A bancarrota do Estado obrigou LUÍS XVI a demitir o ministro Brienne e a nomear novamente Necker. Para obter sugestões, Necker sugeriu ao rei a convocação dos "Estados Gerais", assembleia dos representantes do 121 22 e 32 Estados, que não se reunia desde 1614. (1) "sans-culottes" (tradução: "sem-calças): população pobre de Paris, formada pela massa de artesãos, aprendizes, lojistas, biscateiros e desempregados; teve importante participação nos acontecimentos revolucionários de 1789 a 1794".

Carta de convocação dos estados gerais em Versalhes:

1789 Por ordem do Rei.

Nosso amado e fiel. Temos necessidade do concurso de nossos fiéis súditos para nos ajudarem a superar todas as dificuldades em que nos achamos, com relação ao estado de nossas finanças e para estabelecer, segundo os nossos desejos, uma ordem constante e invariável em todas as partes do governo que interessam à felicidade dos nossos súditos e à prosperidade de nosso reino.

Esses grandes motivos Nos determinaram a convocar a assembleia dos Estados de todas as províncias sob nossa obediência, tanto para Nos aconselharem e Nos assistirem em todas as coisas que serão colocadas sob as suas vistas, quanto para fazer-Nos conhecer os desejos, e queixas de nossos povos, de maneira que, por mútua confiança e amor recíproco entre o Soberano e seus súditos, seja achado o mais rapidamente possível, um remédio eficaz para os males do Estado e que os abusos de toda espécie sejam reformados e prevenidos. Dado em Versalhes, em 24 de janeiro de 1789. Assinado: Luis. Secretário: Laurent de Villedeuil. Ponte: MATTOSO, Kátia M. de Queiróz. Textos e Documentos para o estudo da História Contemporânea, 1789-1963.(São Paulo, HUCITEC, Ed. da Universidade de São Paulo, 1977,).

Decidiu-se que os Estados Gerais se reuniriam em 12 de maio de 1789, constituídos em "ordens" independentes cada uma com o mesmo número de representantes e votando separadamente, como em 1614. Com isso, a aristocracia calculava contar com os votos do 1o. Estado (o Clero) e do 2o. Estado (a Nobreza), contra um voto do 3o. Estado (a burguesia e o povo em geral), assumindo o controle de todas as decisões e és vaziando o poder do monarca. Seria a vitória da aristocracia sobre o Rei e sobre a burguesia.

A convocação para a eleição dos membros dos Estados Gerais trouxe grandes expectativas ao Terceiro Estado. Panfletos e jornais circulavam pelas praças, esquinas e cafés difundindo as palavras de ordem criadas pelos iluministas como: "cidadão", "nação", "contrato social", "vontade geral", "direito do homem", As discussões e os debates ocorriam nos clubes patrióticos, nas sociedades literárias e nas lojas maçônicas existentes nas cidades francesas, colaborando para a politização de seus membros e para a formação de opiniões.

O abade Sieyés foi autor de vários opúsculos que contribuíram para criar a consciência revolucionária do Terceiro Estado. No panfleto "Qu 'est-ce que le Tiers Etat", ele fez progredir o debate sobre a 1 forma de convocação dos Estados Gerais, quando indagava: O que é o Terceiro Estado? - Tudo. O que ele foi até agora na ordem política? - Nada. - O que ele quer? Tornar-se alguma coisa." (CHAUSSINAND GARET, Guy. A queda da Bastilha. Rio de Janeiro, Zahar, 1988, p.35).

A Tomada da Bastilha, por Jean-Pierre Louis Laurent Houel.

Representando cerca de 97% da população do país, o Terceiro Estado conseguiu aumentar sua participação nos Estados Gerais, elegendo 1 61O deputados (a metade da Assembleia), oriundos das fileiras da burguesia (advogados, comerciantes, proprietários rurais, banqueiros), a elas se social que tinha um projeto político para substituir o absolutismo, baseado nos princípios iluministas da igualdade perante a lei e do liberalismo político e econômico.

A massa da população, formada por artesão, diaristas pequenos comerciantes, músicos, aprendizes, etc, não participou das eleições, pois só podiam - votar aqueles que tivessem o ofício ou emprego público, grau universitário ou de mestre de corporação e que pagassem pelos menos seis libras de imposto de capitação.

Para expor seus desejos e suas queixas, os eleitores de cada uma das três "ordens" redigiram seus "Cadernos de Reclamações". De sua leitura depreende-se que o clero, a nobreza e a burguesia eram unânimes em reclamar a liberdade individual e o direito à propriedade, bem como a elaboração de uma constituição que definisse claramente os direitos do rei e os da nação, limitando assim o poder real. A nobreza e a burguesia queriam a liberdade de imprensa; o clero opunha-se à -burguesia e o povo em geral exigiam a abolição dos privilégios e dos direi tos feudais, contra os interesses do clero e da nobreza.

Caderno de reclamações do terceiro estado da paróquia de longey- eleição de chateaudun, generalidade de órleans, bailia do de blois.

Nós, habitantes da paróquia de Longey abaixo-assinados, tendo nos reunido em virtude das ordens do Rei, na sexta-feira, dia 6 do presente mês de maio de 1789, resolvemos o que segue:

Pedimos que todos os privilégios sejam abolidos.- Declaramos que se alguém merece ter privilégios e gozar de isenções, são estes, sem contradição, os habitantes do campo, pois são os mais Úteis ao Estado, porque por seu trabalho o fazem viver.
Que até hoje foram quase os únicos a pagar os exorbitantes impostos de que esta província está carregada; que os campos estão - arruinados e os cultivadores na impossibilidade de poder manter e criar sua família; que à maior parte falta o pão, visto os impostos que os sobrecarregam e as perdas que experimentam todos os anos, seja pela caça, seja por outros flagelos.

Pedimos também que as talhas com as quais a nossa paróquia esta sobrecarregada sejam abolidas; que este imposto que nos oprime, e que só é pago pelos infelizes, seja convertido num só e único imposto ao qual devem ser submetidos todos os eclesiásticos e nobres sem distinção, e que o produto deste imposto seja levado diretamente ao Tesouro. *Pedimos ainda que não haja mais gabela e que o sal se torne comerciável, o que seria um grande benefício para todo o povo e principalmente para nós, habitantes do campo, que pagamos esta mercadoria muito caro e que dela fazemos o maior consumo um imposto que nos e muito oneroso e prejudicial. (Seguem-se 12 assinaturas.) (Mattoso, Kátia M. de Q., op. cit. p. 4/5.)

A instalação da Assembleia dos Estados Gerais deu-se a 5 de maio de 1789, em Versalhes. Os desentendimentos entre os deputados começaram quando a burguesia propôs o voto por cabeça e as duas ordens privilegiadas não concordaram. Durante um mês e meio, a nobreza e o alto clero recusaram-se obstinadamente a votar por cabeça. Diante do impasse, no dia 17 de junho, os deputados do Terceiro Estado apoiados pelo baixo clero proclamaram-se em Assembleia Nacional, decidindo não se separar antes de dotar a França de uma constituição. Isso significa vã a transferência do poder do rei para os representantes da nação e o fim do absolutismo monárquico.

Frente ao perigo que representava o poder da burguesia na Assembleia Nacional Constituinte, a aristocracia recompôs-se com o rei, pregando a utilização da força para dissolver a Assembleia. Mas a revolução popular impediu que isso acontecesse.

O Juramento da Péla.